IMAGENS DE UM COTIDIANO
Tony Lopes
Acordo com o brilho do sol só para mim. Parece que ele ilumina o que não deve. Parcial, imprevisível e sonso ele sorri para o mar que banha os meus pés descalços numa dessas manhãs que poderiam ser diferentes enquanto se recusa a iluminar outros sítios longe de tudo.
Todos sabem que não gosto do sol, e que o mar não passa de uma possibilidade de ir.
Pacífico, meu olho bom procura suntuosas naus para redescobrir novos caminhos. O mau, se abstém de ver o que nem sempre é óbvio mas está ali como o atlântico que me vigia sem dó.
Antes de seguir o caminho obrigatório desvio por centímetros do que está ali, no caminho, antes do farol e logo após o castelo abandonado.
Uma cidade é feita de escombros e seus fantasmas. Restos de pedras que se recusam a ir. Adormecidas pelo tempo e esquecidas pelos que deveriam se importar.
A minha alma não carece do sal do mar. Ele se formou com as intempéries do tempo. Mas permanece doce naquilo em que é possível ser doce. Como o mar, para uns e outros.
Atravesso o último trecho do calvário diário com a fome dos que não tem o que comer e a sede dos que ainda acreditam no oásis que nunca chega. Mesmo depois da tempestade.
Um dia, todos nós estaremos rindo como fazíamos antes numa mesa de bar. E não será apenas uma tarde qualquer. Nem um brinde em vão. Faremos valer a pena cada instante.
Juana Toro
Vasos, colillas
sofás rotos, sucios
gatos
Drenajes corren
se vierten en charcos
gasolinados
El sol sobre su
pómulo craquelado
pegaduro
Silvana Costa
Torneira aberta, água jorrando enquanto a xícara é ensaboada, sinto o aperto do short incomodar a coxa. Sensação de que este corpo não é meu, ou a roupa que antes cabia certinho resolveu me sacanear e encolher... não estou fazendo nada de diferente, o que mudou?
Antes que uma possível explicação surgisse, lembro que o almoço não se prepara sozinho; o caos doméstico é como o símbolo do infinito, é impossível saber onde começa ou termina.
A manhã segue ensolarada, perfeita para praia e cervejinha, mas o mais próximo que chego do calor é quando acendo a boca do fogão. Ainda há muito por fazer e o relógio não espera. A gatinha corre pela casa, dando a largada para o circuito das dez: ligada no 220W, a jovem felina parece brincar com os seres do além e essa interação alegra o meu dia.
O tempo voa e o costume de ver o jornal do meio-dia não me larga. As notícias não são boas, a tensão que vivemos parece palpável. O que acontece no país tira o sono e deixa na boca o gosto amargo da impunidade. A notícia do dia está sendo chamada de cortina de fumaça por alguns - um condenado que cumpre sentença com pulseira eletrônica em casa, um privilégio para poucos, ofende uma ministra do supremo e a tentativa de levá-lo em custódia encontra resistência, com espaço para reação com uso de arma de fogo - mas, para mim, soa como gatilho para civis que se armaram com a benção de um mandatário perverso irem às ruas cometer injustiças com as próprias mãos, sob o pretexto de defender valores morais e combater um comunismo idealizado.
O almoço está pronto, mas acho que perdi a fome.
Arturo García Hincapié
Es el último refugio, no como el final, sino el más escondido. Está en lo más adentro, lejos de la superficie, en lo profundo. Es un monstruo, el más grande, el más extenso y el más presente. Está en todas partes, con todas sus partes, presente. Ahí. Oculto, nunca aislado. Hay más escondites, es cierto, está el primero, el segundo y así hasta llegar al último. Todos esconden, siempre esconden. Son estructuras para proteger un mensaje, un solo mensaje se guarda en todas ellas. Su protección es escapar. Escapa del instante porque le debe a este y su deuda es por imitar. Un monstruo imitador, no, no lo es. Es solo un monstruo, la prueba de que existen. La verdad.
Y hay titanes, los hubo, hablo del amor, del odio, de la amistad; hablo de los que antes fueron dioses, los que murieron de olvido. Bueno, pues hay un rastro de ellos. Existen y están entre nosotros. De alguna forma deambulan por los alrededores, pero sí están entre nosotros, tenemos que considerar un interior, nosotros como un espacio que, un lugar que, un instante que. Nuestro interior, en donde pende la subjetividad más extensa de todas, sino la más extenuante. Imita el cuerpo, se basa en su forma, toma prestada la apariencia, declara que existe.
La existencia y sus analogías. La alegría y la perdición, un bizcocho de novia y el ataúd, el primer automóvil de una señora, los últimos días de alguien. La felicidad es pasajera; los velorios son un tipo de fiesta; un lejano presente nos conserva a todos en la adolescencia. Todo oculto pero a la vez manifiesto, a merced de las connotaciones. Oculto por las tendencias, se mueve lento, distinto a como hoy se desplazan las ideas. El significado de una foto llega, llega tarde. Es el último refugio, el que está al final, el final de la imagen es significar.
Qué significa este rayo de luz que ilumina las voces que nos acompañan. Confabulan dos naturalezas, lo que es y lo que parece ser. Qué significado le damos. Nos vemos. La distancia está en que nos interpretamos. Vernos puede ser una acción pasiva, lo es. La interpretación es la exaltación, la excitación de al menos un sentido. La interpretación hace que la acción sea nuestra actividad. Y muchas veces, una fotografía es el respaldo de un recuerdo, ocurre siempre que lo que recordamos es una ensoñación; a los vestigios cada que los vemos nos recuerdan distintas formas de llegar.